terça-feira, 30 de junho de 2009

PORTO PRÍNCIPE / MANIFESTAÇÕES/ VIOLÊNCIA/ O centro da cidade refém!



Novamente, o ciclo de violência ...
Pneus queimados, pára-brisas de veículos danificados, pedras, fogo, barricadas nas áreas adjacentes às várias entidades da Universidade do Estado do Haiti (UEH) ..., os focos de tensão se multiplicaram na quinta-feira (18 de junho), em toda a capital haitiana, com as manifestações estudantis em favor da promulgação da Lei do Salário Mínimo. Além disso, acrescentou-se à oposição do Presidente da República com a publicação da lei, a morte de um rapaz perto da Catedral de Port-au-Prince durante uma manifestação pró-Lavalas, no momento do funeral do padre Gerard Jean-Juste. Tudo isso acrescentou combustível para o fogo.
O incidente ocorreu perto da Catedral de Port-au-Prince, quando um ativista Lavalas, atingido por um projétil, sucumbiu aos seus ferimentos. Isto veio a ser adicionado a uma situação já tensa e que dura várias semanas na capital Haiti. A vítima, cuja identidade não foi revelada, foi atingida por uma bala disparada por membros da Missão das Nações Unidas para Estabilização no Haiti (MINUSTAH), segundo as provas preliminares provas recolhidas no local. Vários feridos também foram registrados em confronto com a polícia. Em represália, os manifestantes quebraram as janelas de dezenas de veículos estacionados perto do Ministério da Cultura e da Comunicação (MCC).
Os manifestantes se dirigiram para as proximidades do Palácio Presidencial onde colocaram o corpo da vítima, que seria levada, poucos minutos mais tarde, por uma ambulância. Durante uma entrevista de rádio, a porta-voz da missão da ONU, Sophie Boutaud de la Combe advertiu contra a versão segundo a qual o militante lavalas teria sido morto por um tiro da ONU. Segundo ela, os capacetes azuis reagiram dando um tiro para o alto, nas proximidades da Catedral de Port-au-Prince.
Paralelamente à manifestação dos ativistas lavalas, estudantes de diferentes faculdades da Universidade do Estado do Haiti (UEH) continuaram a pedir, na quinta-feira, a promulgação da lei do salário mínimo, depois que o Presidente da República já tinha, na quarta-feira (17/6), manifestado sua oposição a esta lei, no Parlamento. Forçado a se retirarem de suas respectivas faculdades, após o lançamento de uma profusão de gás lacrimogêneo pela polícia, alguns universitários disseram que não vão retroceder e que o movimento irá continuar até satisfação de suas demandas.
No início do dia 18 de Junho, a polícia tinha montado guarda perto das Faculdades de Medicina e Farmácia, Ciências Humanas, do Inaghei, da Escola Normal Superior e da Faculdade de Etnologia, de onde partem geralmente as manifestações estudantis. No entanto, pneus queimados queimando pneus foram observados nas proximidades dessas faculdades.À chuva pedra dos estudantes sitiados, a polícia respondeu com gás lacrimogêneo. Este cenário, que persistiu por duas semanas levantou os temores de muitos. Um professor da Universidade instou os estudantes a voltar à sala de aula, mas sem sucesso. Já na quarta-feira, a alta tensão prevaleceu nas proximidades da Faculdade de Medicina e Farmácia. Um jornalista da Estação Rádio Galaxie, Ernst Cardichon, escapou de um tiro na mão, enquanto cobria o evento. Por outro lado, um veículo da ONU foi queimado. Este ato foi atribuído a moradores que apóiam a causa dos alunos. Vários outros veículos foram danificados pelas pedras.Durante 15 dias, moradores da cidade são feitos reféns pelos eventos diários de estudantes, que resolveram exortar o Executivo a publicar no jornal oficial Le Moniteur a lei "Benoit" sobre o salário mínimo. Com a entrada em cena dos ativistas Lavalas, na quinta-feira, durante o funeral do padre Gerard Jean-Juste, é possível dizer que se trata de um novo ciclo de violência.
Por Ladenson Fleurival- Le MatinSexta-feira19 juin 2009
Tradução: Renata de Melo Rosa

sábado, 27 de junho de 2009

Contextualizando o Haiti

Desde o seu surgimento como nação independente, o Haiti tem se mostrado um desafio intelectual para o campo das ciências sociais[1] e, contemporaneamente, para os instrumentos de proteção internacional dos direitos humanos. Facilmente rotulado de Estado falido[2], a dificuldade cognitiva na elaboração de um pensamento sólido sobre o país reside em um (falso) dilema, a saber: como a famosa “pérola das Antilhas”, berço da rebelião negra de 1793 e espaço da primeira República Negra das Américas, tornou-se o país mais pobre de nosso continente?A compreensão deste cenário complexo exige do pesquisador um pouco mais de atenção aos detalhes históricos que acompanham a trajetória política do país, desde a sua formação colonial. As reflexões de Jean Casimir[3] constroem, sem dúvida, relações interessantes frente a estes questionamentos. Com o objetivo de investigar a maneira pela qual as elites haitianas gravitaram ao redor do poder, Casimir aponta que qualquer que fosse o grupo político que ocupasse o poder no Haiti, o paradigma da manutenção de privilégios em detrimento à implementação de um projeto coletivo de sociedade sempre foi a tônica do modelo de desenvolvimento do Haiti. Assim, desde o engajamento dos “libertos[4]” na luta de independência e fim da escravidão no século XVIII, já se podia notar que antes de ser uma classe revolucionária, os “mulatos[5]” aliaram-se aos trabalhadores escravizados apenas para a consecução de um único objetivo: derrotar a França e substituí-la no poder. Alcançado este objetivo, os mulatos ou libertos mantiveram-se na mesma classe que outrora ocupavam: a de senhores de privilégios, os quais só poderiam ser mantidos com a reprodução do sistema de plantation e com a racialização das relações de trabalho.Em busca de sua manutenção no poder, os “mulatos” não titubearam em fazer acordos dos mais grotescos e contrários aos “interesses nacionais”, tais como: aceitar o pagamento de indenização à França pela independência, em 1844, na administração de Jean Pierre Boyer; colaborar com a intervenção norte-americana em 1915, além de as elites mulatas não se importaram com o fluxo de trabalhadores à República Dominicana, no início da década de 30, cujo resultado primeiro foi o ato de genocídio cometido pelo General Trujillo, em 1937, em Dajabón/RD[6], província dominicana que faz fronteira entre os dois países, que contabilizou mais de 5 mil mortos. Desde então, a presença haitiana da República Dominicana tem sido dramática, tanto pela haitianofobia cultivada no pensamento social dominicano[7], como pelo constante fluxo de haitianos que chegam cotidianamente ao país[8].De lá para cá, as sucessivas violações não deixaram de acontecer e sempre tiveram respostas bastante tímidas de todos os governos haitianos. Um dos nossos supostos de pesquisa é que a fragmentação das elites, da classe política e o isolamento do Haiti em relação ao continente reflete a própria correlação de forças existente internamente no país, a partir da qual um projeto de nação só conseguiu atingir patamares mínimos de mobilização nacional a partir do surgimento do Partido Lavalas, do ex-presidente Jean Bertrand Aristide, em um momento bastante específico: de 1986, após a saída de Jean Claude Duvalier do poder até a ascensão e queda de Aristide ao poder, em 1991. A partir deste período, as tentativas de construção de uma unidade nacional não conseguiram êxito, também porque no período de 1991 até os dias atuais, o país foi foco de mais de 8 intervenções internacionais. A fragmentação da nação haitiana deve-se à relação pouco orgânica que as elites sempre mantiveram com o resto da população (à exceção do período de ascensão do Lavalas), com o modo de ocupação territorial do país, majoritariamente rural até a meados da década de 80[9] e com o isolamento que muitas comunidades rurais, confinadas em seus territórios, mantiveram com o poder central de Porto Príncipe. A ausência de rodovias capazes de ligar os departamentos, bem como de linhas telefônicas com tecnologia suficiente para conectar o país como um todo também contribuíram para este isolamento e para fazer da população rural fosse vista internamente como um segmento de 2a. categoria, sujeita (quando exposta à contextos mais ocidentalizados do Haiti e República Dominicana) à racialização das relações de trabalho.
[1] Ver TROUILLOT, Michel-Rolph. “The Caribbean Region: An open frontier in anthropological theory”, Annual Review of Anthropology 1992, 21:19-42.
[2] Ver Susan L. Woodard “Estados falidos: o peso das palavras”
[3] Ver Jean Casimir “Haití y sus élites de poder” (mimeo)
[4] Neste projeto, acompanharemos as mesmas categorias utilizadas por Aimé Cesaire em Toussiant Louverture, La Habana, Cuba: Instituto del Libro, 1967; Jean Casimir, op. cit; Leon-François Hoffman. “Slavery and Race in Haitian Letters” In: Caribbean Review, 9 (2): 28-32, 1980 e Harry Hoetink. Caribbean Race Relations: A Study of Two Variants, London: Oxford University Press, 1967. Em todas estas obras, as categorias “liberto e mulato”, sobretudo para Aimé Césaire e Jean Casimir, no período colonial são utilizadas para designar o mesmo “status” de pessoa. No Haiti pós-independência, as categorias “negro e mulato”, sobretudo para Hoffman e Hoetink, não se referem a fenótipos distintos, mas a grupos de poder cuja trajetória histórica os diferencia.
[5] Para a discussão acerca do entrelaçamento das categorias “mulatos” e “libertos” na Saint Domingue colonial ver Aimé Cesaire, op. cit.
[6] Sobre o relato deste massacre, ver Alan Belén Cambeira. “Historical and Cultural Connections: La République d’Haiti and La República Dominicana” In: The Dominican Republic in Historical and Cultural Perspective, New York: M. E. Sharpe Publishers, 1997 e DANTICAT, Edwidge. Cosecha de Huesos, Barcelona: Lúmen, 2000.
[7] Para a checagem da haitianofobia retratada no pensamento social dominicano, ver as obras de Joaquín Balaguer, La Isla al Revés, Haití y el Destino Dominicano, Santo Domingo, República Dominicana: Edit. Librería Dominicano, 1984; Emilio Rodríguez Demorizi. Invasiones Haitianas de 1801, 1805 y 1822. Ciudad Trujillo: Academia Dominicana de la Historia, 1955; DESPRADEL I BATISTA, Guido. Raíces de Nuestro Espíritu: un Ensayo. Santo Domingo, República Dominicana: Renovación, 1971; GARCÍA, José Gabriel. Compendio de la Historia de Santo Domingo. Santo Domingo: Imprenta de García Hermanos, 1892; MARRERO ARISTY, Ramón. República Dominicana: origen y destino del pueblo cristiano más antiguo de la América, Ciudad Trujillo, República Dominicana: Ed. Del Caribe, 1957; SÁNCHEZ VALVERDE, Antonio. Idea del Valor de la Isla Española, Ciudad Trujillo, República Dominicana: Editoria Montalvo, 1947.
[8] De acordo com os estudos mais recentes de Rubén Silié, estima-se mais de 1 milhão de haitianos na República Dominicana. Ver La nueva inmigración haitiana. RD: FLACSO, 2002.
[9] Ver Gerald F Murray. “Bon-Dieu e os ritos de passagem no Haiti rural: determinantes estruturais da teologia e dos rituais pós-coloniais” In: Estudos Afro-Asiáticos, no. 19, 1990.

sexta-feira, 5 de junho de 2009

Núcleo de Estudos de Diplomacia Responsável

O Núcleo de Estudos de Diplomacia Responsável foi criado no ano de 2006, no curso de Relações Internacionais do UNICEUB e tem como missão observar em profundidade ações significativas de diplomacia responsável entabuladas de forma bi ou multilateral, tanto entre países de níveis econômicos desiguais como entre os países em desenvolvimento, preferencialmente nas ações de combate às desigualdades, à exclusão e à pobreza, com ênfase no apoio às políticas de inclusão e combate ao sexismo e ao racismo. No decorrer do ano de 2006, o projeto desenvolvido pelo Núcleo intitulado "Diplomacia Responsável: a presença do Brasil no Haiti", recebeu apoio finaceiro do CNPq, mediante aprovação no Edital 61/2005 e apoio da CAPES, mediante a concessão de bolsa de pós-doutorado para aprofundamento desta pesquisa na cidade de Porto Príncipe/Haiti.